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No STF, um assento para advogados

Posto em 10 de setembro de 2015

No STF, um assento para advogados

         A crônica é longa. Hoje em dia os jovens leem pouco. A maioria despreza as regras ortográficas, o que é até elogiável quando conjugado a acordo feito entre Brasil e Portugal. Dizem que em Lisboa há profundo desprezo quanto ao ajuste. Aqui, a maior discussão é saber se Dilma, chicoteada pelo “flanelinha” da esquina, é “presidente” ou “presidenta”. Tal dúvida chega a ser chacota no entremeio da crise em evolução.

Já se viu, o escrito não começa bem. Cronista é assim. Às vezes, acorda “com os chifres virados”. Vai daí, acerta quem primeiro aparecer à frente. É mau e é bom. É mau porque o ser humano deve buscar equilíbrio adequado à sobrevivência. É bom, na medida de positivação do ideário. Há uma terceira razão, vinda à consciência enquanto se formam as sinapses: Sérgio Augusto, meu cronista preferido no “Estadão” (mantenho a assinatura por causa dele, deviam aumentá-lo), fez ontem, 9 de setembro,  reflexões curiosíssimas sobre o funcionamento do cérebro da gente. Contou que tem, de vez em quando, obsessões  sonoras dizendo com melodias a se repetirem centenas de vezes naquele mundo  muito secreto da consciência (ou do inconsciente?). Diz que existe quem enlouqueça por causa disso. Quanto a ele, aprendeu a se defender com antídotos. Apropria-se de outra música e tenta colocá-la no lugar da primeira. Uma espécie de antibiótico. Quanto a mim, meu problema é com boleros e tangos. Procuro mudar “Mano a mano” para “Por una cabeza”. Trata-se de fenômeno psiquiátrico. Há outras teimosias: realço a questão da falta de assento para advogados no plenário da Suprema Corte.

Feita a digressão suavizante, prossigo. Retorno ao “Estado de São Paulo”, visto enquanto passava o primeiro ônibus na Rebouças. É o meu despertador. Há notícia grande sobre determinação advinda do Supremo Tribunal Federal no sentido de que os Estados cumpram as regras atinentes ao aparelhamento de presídios e manutenção de um mínimo adequado a que os reclusos não se matem. Aquilo não é uma reivindicação. Determina-se. O recado é direto a Geraldo Alckmin. Cumpram-se, pois, os mandamentos. O escriba ficou entusiasmado. Entretanto, enraiveceu-se ao ver, no texto, uma foto do plenário da Suprema Corte, bonito por sinal, mas constituindo corpo de delito de desobediência a lei federal em plena vigência. O Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil disciplina, no artigo 7º, inciso XII, o comportamento dos causídicos durante os julgamentos. Assegura ao profissional o direito de falar sentado. Leia-se: …“falar, sentado ou em pé, em juízo, tribunal ou órgão de deliberação coletiva da Administração Pública ou do Poder Legislativo”. Não se diga que a maior corte judiciária do país desconhece tal fato. A lembrança foi posta objetivamente em carta, transcrita abaixo, mandada ao Ministro Ricardo Lewandowski. Aquele escrito foi transformado, elegantemente, em estímulo a procedimento administrativo remetido ao Ministro Marco Aurélio de Mello, guardião do Regimento Interno. Um serventuário, convocado a apreciação, afirmou que o requerente não tinha legitimidade para pretender o cumprimento da lei. Digo, com absoluta transparência, já o tendo escrito alhures, que Marco Aurélio de Mello significa para mim, estendendo-a aos outros, a imagem exata de juiz-modelo. Entretanto, o procedimento foi ao cesto de lixo, relegado ao esquecimento. A legitimidade seria da OAB. Coisa alguma. Pertence, tal direito, a cada qual dos novecentos mil advogados integrando a profissão, descontando-se do número o desmazelo com que o Ministério da Educação vem borrifando aos ventos a cornucópia dos fenômenos corruptivos. Tenho, sim, a chamada “legitimatio ad causam”. Mereço respeito a tal prerrogativa.

Afirmar-se-ia que o assunto é escandalosamente ridículo: no meio de problemas gigantescos assolando a nação, um criminalista antigo insistindo em tomar assento à tribuna enquanto fala. Não é não. Cuida-se, simplesmente, do descumprimento de diploma legal em plena vigência. O STF tem dado exemplos de intervenção regulamentadora das relações entre o individuo e o Estado. Receba encômios. Dê mais este. O ser humano é, estritamente, animal simbólico. Nascemos, vivemos, amadurecemos e morremos no meio da simbologia, isto desde tempos extremamente primitivos. Aquilo não é uma cadeira simplesmente, Ministros. É o símbolo maior do acatamento à dignidade da advocacia. Somos sabidos, todos nós. Lemos Jung, com certeza (O Homem e seus símbolos). Precisamos daquele assento, não só por ser nosso, mas para que nos comportemos dentro das paralelas estatutárias. É gesto pequeno. O Ministro Joaquim Barbosa tinha duas poltronas, movimentando-se entre ambas com a agilidade adequada ao seu temperamento. Basta a transposição de um deles. Há de ser, Eminentes Ministros, grande demonstração do carinho que precisa unir a beca e a toga, principalmente para enfrentamento do vendaval explodindo nesta sofrida nação.

‎Posto em 29‎ de ‎setembro‎ de ‎2014

Assento para advogados à tribuna do STF

         Consta que o novo presidente da Suprema Corte, Ministro Ricardo Lewandowski, decidiu mandar colocar rampas de acesso ao plenário, facilitando assim a aproximação de advogados deficientes físicos. Cuidava-se de reivindicação antiga da Secção de São Paulo da OAB, não só isso, mas também a dotação de assentos junto à tribuna, pois os profissionais do direito, durante e depois das sustentações orais, falavam ou aguardavam em pé, assim permanecendo às vezes por muito tempo. Não foi por outra razão que seccional paulista da Ordem dos Advogados foi ao Conselho Nacional de Justiça, obtendo resolução indicativa do deferimento às duas pretensões.

         A notícia é boa, e muito. O ser humano é, supinamente, animal simbólico. Vivemos no meio de tabus, totens e ícones. A poltrona a ser colocada junto à tribuna, no STF, seria demonstração expressa da maior proximidade entre a mais alta Corte do país e os advogados. Ver-se-á. Seria um gesto simples, mas importantíssimo. Tocante à rampa, o cronista pôde ver, tempos atrás, a dificuldade com que Romualdo Sanches Calvo Filho, presidente da Academia Paulista de Direito Criminal, encontrou para desenvolver sustentação oral naquele tribunal. Aproximou-se com muita dificuldade, mas o fez com extrema competência porque, embora cego, sabia a colocação, no areópago, de cada ministro ou ministra, tendo estudado previamente e memorizado a situação física de cada qual.

         Aquela sustentação oral pareceu ao cronista um comportamento análogo ao do cantor-compositor Ray Charles, que conhece à perfeição cada tecla do piano usado em suas apresentações.

         A associação de ideias é fenômeno interessantíssimo: enquanto ditava a crônica, o cronista se lembrou da canção que deu nome à segunda filha, maravilhosa criatura, posta neste mundo de Deus. Chama-se Geórgia a moça, penalista sublime e hoje quase veterinária formada. Dentro do contexto, a chegança do assento para os advogados depende só de uma simples ordem administrativa do presidente da Corte. Segue a metade dos parabéns devidos. O remanescente é guardado com muito carinho. Em homenagem a Romualdo, culto, corajoso e experimentado criminalista, vai, abaixo, o áudio da música relembrada.

Posto em 15‎ de ‎outubro‎ de ‎2012

Supremo Tribunal Federal precisa cumprir a lei

         O artigo 7°, inciso XII, do estatuto da advocacia permite ao advogado falar em pé ou sentado. Nós, os setecentos mil advogados inscritos na corporação respectiva, preferimos sempre a primeira hipótese, cuidando-se, certamente, de postura máscula a permitir maior liberdade na movimentação corporal. Entretanto, se e quando quisermos, falamos sentados, circunstância esta proibida no STF, onde não há assento junto à tribuna de defesa. O cultíssimo presidente da Suprema Corte, Ministro Ayres Brito, deixa o cargo proximamente, em razão de aposentadoria forçada, logo agora em que os brasileiros não só vivem mais, mas mantêm, septuagenários, vitalidade invejável não faltante, aliás, à presidência do Supremo Tribunal Federal. Vem em sequência, já eleito, o Ministro Joaquim Barbosa. Um e outro podem, durante a cerimônia de transmissão das augustas funções, determinar que o protocolo coloque um assento junto ao púlpito, permitindo-se então a positivação da lei vertente. Na verdade, trinta e poucos advogados interferiram durante o julgamento, uns jovens, outros amadurecidos em idade, integrando a defesa, aliás, dois antigos Ministros da Justiça. Se não reclamaram, deixaram passar por elegância, mas a gentileza, em certas oportunidades, coonesta o descumprimento da lei. Fica aqui, solitariamente, a reclamação. Há setecentas mil testemunhas olhando, contritas e silentes. Alguém, ou alguns, hão de dizer que o incidente tem importância secundária, pois problemas maiores exigem a atenção daquele augusto sacrário. Dentro de tal contexto, diga-se que o ser humano é, visceralmente, animal simbólico. Juízes usam toga. Todos os presentes se levantam quando eles entram no plenário. Advogados vestem becas nos entrechoques oficiais. Tratam-se untuosamente. Há, em tudo, um ritual a não ser desprezado. Entretanto, no cerimonial vertente, a lei está sendo descumprida, sugerindo-se aos onze ministros da Corte Suprema a lembrança da existência de tal ofensa. Aliás, cada qual dos trinta e poucos criminalistas atuantes são fiscais do cumprimento do estatuto, sem exceção, ao longe, de todas as seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil.

 

“Ofício nº 217/GDG

Brasília, 5 de dezembro de 2014

 

Ao Senhor Doutor

Paulo Sérgio Leite Fernandes

Advogado da OAB – SP

São Paulo – SP

Assunto: Assento na tribuna destinada aos advogados

 

Senhor Advogado

Em resposta a seu Ofício s/nº, de 12 de setembro de 2014, informo a Vossa Senhoria que o pedido foi indeferido nos termos da decisão do Senhor Ministro Marco Aurélio, presidente da comissão de  Regimento Interno deste Tribunal, cuja cópia segue anexa”

____________

Processo Administrativo nº 355.446

Origem: Gabinete do Diretor-Geral

Interessado: Ordem dos Advogados do Brasil

Assunto: Assento na tribuna destinada aos advogados

Decisão: Processo administrativo - Interesse da advocacia - Legitimidade – Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil.

(Brasília, 09.11.2014)

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