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DIA INTERNACIONAL DA MULHER

(Abstenção sexual?)


Paulo Sérgio Leite Fernandes

Hoje, 8 de março de 2017, é dia internacional da mulher, mas não precisava sê-lo, porque todos os dias são delas. Curiosamente, lembrei-me disso ontem, enquanto ouvia pelo rádio a “Voz do Brasil”, raridade aliás, pois tenho a impressão de ser o único ouvinte. Viciei-me naquilo porque precisava libertar-me das tensões do trânsito, preferindo, então, o dizer do locutor àquelas infernais músicas sertanejas vindas aqui e ali, tudo misturado em anúncios de refrigerantes ou do boi congelado corruptor de Robert de Niro, veja-se que lástima, meu herói na antiguidade. Na verdade, toda criatura tem seus ícones, a partir, para as moças, da “COLEÇÃO AZUL” de M. Delly e, para os meninos, do “PRINCÍPE SUBMARINO”, já falecido e substituído por Skywalker ou Batman. Perceba-se a confusão: começo na Voz do Brasil, prossigo na propaganda do filet mignon e, no meio disso, falo nas mulheres em geral, com relevo para os romances da velha guarda. Para quem não sabe, a “COLEÇÃO AZUL”, nos idos de 1948, era a preferida pelas adolescentes, aquelas que, aos 15 anos, debutavam nos clubes tradicionais das cidades de pequeno e médio porte. Havia o “carnet”, ou seja, o caderninho, onde as meninas marcavam seus compromissos de dança. Tudo muito comportado, embora se diga que lá e aqui as coisas sempre foram iguais. Entretanto, havia uma sorte muito grande de sofisticação. M. Delly contava histórias de amor, sim, mas nada assemelhado àqueles livros batendo, agora, recordes de vendagem (50 tons de cinza, amarelo, vermelho) e tudo mais. Coisa parecida eu só li na trilogia de Henry Miller (SEXUS, PLEXUS e NEXUS), um trabalho danado, mas muito melhor, porque, afinal, Miller foi Nobel de literatura…
Vai daí, a nebulosidade da crônica parece ficar pior ainda. O que tem a “Voz do Brasil” a ver com as debutantes dos anos 40?. O programa oficial da Presidência da República, muito chato, diga-se de passagem, teve, na tardinha de ontem, insista-se, seu momento de brilho: a senadora Gleisi Hoffmann, moça elegante, fez discurso comemorativo do dia internacional das mulheres, dizendo uma espécie de decálogo atinente à data, ou seja, uma proposta de realizações. Eu vinha perdido no meio do trânsito, sem enrabichamento qualquer na produção agropecuária brasileira, embora sabendo cuidar-se, igualmente, de assunto grave. De repente a locutora sintetizou o discurso de Hoffmann*: “Vai ser um dia de greve… de abstenção do trabalho doméstico, de abstenção dos cuidados, de abstenção sexual…”. Providência lembrada, inclusive, a poder de um filme muito engraçado chamado “Guerra dos Sexos”. Realmente, a senadora quer que hoje, data mundialmente consagrada à mulher, haja precatação quanto aos atos de amor (tradicionalmente entre casais de sexos opostos), havendo novidades atuais. Eis aí o que os juristas chamam de questão incidental, porque não se vê qual a relação entre esse tipo de retração física e a comemoração já referida, da qual toda a humanidade deve participar. Diga-se: houve, na China, durante muito tempo, restrição a que os casais tivessem mais que um filho, pois o aumento de população se tornava expressivo. O dia universal da mulher é, sim, uma efeméride a ser comemorada com muito carinho, flores e homenagens especiais, não se encontrando forma outra de especialização que não seja um profundo agradecimento a todas elas, sabendo-se que vigiam permanentemente para que seus homens não se transmigrem no respeito à honestidade, ética e bons costumes. Dito isso, preferiria ter ouvido mal a descrição feita pela locutora. Teria dito, talvez, abstenção carnal, no sentido de não se comer carne, mas sexual nunca. Se me enganei, minhas escusas solenes.
Finalizando: este site se dedica a comentários sobre direito penal e processo penal. É extravagante, então, uma crônica sobre assunto diferente, mas não se há de pretender comemorar momento tão expressivo com um tema mais adequado à ciência criminal. Digo isso por lembrar-me de que tempos atrás, em data igual à de hoje, uma faculdade de direito me convidou a proferir palestra sobre “Mulheres que matam”. Que absurdo! Parabéns a todas.

*Voz do Brasil: Jornal do Senado, data 07 de março de 2017.

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