Home » OS BONS NEGÓCIOS

OS BONS NEGÓCIOS

(Roberto Delmanto)

 

Começamos a advogar praticamente juntos há mais de 50 anos, sempre na área criminal.

Eu, no escritório de meu pai Dante e meu irmão mais velho Celso. Ele, corajosamente, apenas na companhia de um colega, em escritório próprio.

Talentoso, trabalhador e estudioso logo começou  a se destacar, angariando boa clientela.

À época, a comarca de São Paulo tinha apenas 24 Varas Criminais, todas sediadas no segundo andar do prédio do Tribunal de Justiça,  com os cartórios localizados no terceiro. O Primeiro, e  único, Tribunal do Júri, joia da arquitetura clássica, também ficava no segundo andar, ao final do Salão dos Passos Perdidos, com o cartório ao lado.

Não existiam Foros Regionais, STJ ou Justiça Federal de 1º grau, sendo os apelos dos processos desta julgados pelo então Tribunal Federal de Recursos.

Assim, eu e o  colega nos encontrávamos com frequência no prédio do Tribunal de Justiça, ocasião em que trocávamos ideias, comentávamos casos nossos que tinham semelhanças e, como costumam fazer os advogados, elogiávamos os juízes humanos e liberais, o mesmo fazendo em relação aos membros do M. Público que honram o parquet  ao pedir, por imperativo de consciência, a absolvição de um acusado, criticando, é claro, magistrados e promotores excessivamente rigorosos…

As conversas eram sempre permeadas de bom humor, agradáveis e construtivas, comumente trazendo, ele ou eu, um novo acórdão ou uma  doutrina recente que servisse aos nossos clientes.

Um único detalhe me incomodava um pouco. Ao se despedir de mim, ele, que era de origem árabe, costumava sempre me desejar “bons negócios”.

Procurei fazê-lo entender que nós, os advogados, não fazemos “negócios”, mas sim somos contratados para atuar em um processo que, na área criminal, envolve a liberdade e a honra, bens maiores do homem. Daí, porque recebemos honorários, cuja palavra vem justamente de honor, ou seja, de honra.

O simpático colega concordava comigo, mas, ao se despedir, acostumado que estava, sempre voltava a me dizer: “bons negócios”.

Desisti, então, de tentar corrigi-lo. Há tempos não o vejo, não sabendo se ele continua a advogar e, sobretudo, a fazer aos colegas, da mesma maneira peculiar, votos de sucesso financeiro…

Deixe um comentário, se quiser.

E