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UM ENTERRO PARA SUZANA

Paula Bajer

                                                                Paulo Sérgio Leite Fernandes

Paula Bajer chega à literatura outra vez, agora com “Um Enterro para Suzana”. São 17 contos policiais, começando naquele a dar título ao livro, passando por “Carteira de Identidade” e terminando em “Mas que Conto?”. Personagens inusitadas aparecem. Por exemplo, “Gisele F: Detetive Particular”. A investigadora tem seus 35 anos. Usa botas de verniz branco, de saltos retos, franjas, bicos finos. Os pés estão sobre a mesa, cruzados. Lê, a detetive, uma revista da moda, a “Cláudia”. Abaixa a revista e Laura vê que Gisele é morena, cabelos crespos cortados perto do pescoço. Um caso típico de adultério pedindo gravações para aumento de pensão?

         Gisele deve aos Bancos, não pode recusar o serviço.

         Começa assim a primeira história do oitavo livro de Paula Bajer, romance policial, sem dúvida, mas não exclusivista, porque a escritora é pródiga em outros temas, sempre românticos e terminando em circunstâncias inusitadas.

         O conto começa bem. Em 60 anos de advocacia criminal, este cronista só topou uma vez com detetive feminina, uma loura oxigenada que não passaria despercebida em lugar algum. Outra coisa, a entrevista com a investigadora: este incorrigível sexólogo já indagava, à primeira frase, se a detetive vestia saia ou calças compridas. E as pernas? Eram bem torneadas?

        Conto policial precisa ter morte. Havia um suspeito, um alemão chamado “Dirk”. E daí?

Paula Bajer é exímia criadora de suspenses. Com escrita fácil, mas saborosa, uma pontinha de sensualidade aparecendo aqui e ali, sem exageros, pois nem só de sacanagens vivem os romancistas. Vale a imaginação dos leitores, que são férteis naquilo.

        A profissão de Paula Bajer é um mistério. Tem nome curto, não dimensionando seu outro Eu. Basta dizer que a autora é, na atualidade, uma das grandes escritoras policiais que o Brasil tem, trabalhando sobre os segredos da alma e personalidades extravagantes. Há no livro tópicos instigantes. Por exemplo: “-O sangue da amiga escorrendo no corredor. Quem usou a faca de cabo vermelho, a preferida da detetive?

        Este antigo marujo da advocacia criminal sempre teve curiosidade intensa para descobrir, havendo nome suposto, qual seria, de verdade, o criador do texto, escondido prosaicamente sob o personagem burguês: Quem é Paula Bajer ? Aqui, o escriba se lembra de episódio em que um lorde inglês, curador do Museu Nacional, desapareceu de casa repentinamente. Uma particularidade: As palmas de suas mãos eram cobertas por calos. Às perguntas da mulher, respondia que não podia deixar aos empregados, sem auxílio, a tarefa de carregar esculturas preciosas de um lado para o outro.

        Pois bem, dias depois do sumiço do diplomata, não localizado pelos esforços oficiais, um estivador foi descoberto em enfermaria suja de um hospital portuário. O acidentado, todo enrolado em ataduras, exibia somente o rosto aos passantes. Um repórter mais ágil o reconheceu. Aquele trabalhador braçal era, extravagantemente, o lord desaparecido. Tinha duas famílias, uma elegante e perfumada, outra tomando banho uma vez por semana com sabão de pedra. Aquele ser esquisito tinha personalidade bipartida. Era capaz de usar uma sobrecasaca de gala e vestir, dia seguinte, uma rasgada roupa de brim grosso, mais botas enlameadas ferradas nas solas.

        Diriam que tal dualidade é extremamente rara. Não é não: Marta, a brasileiríssima expoente do futebol universal feminino, é capaz de cuspir no chão durante uma final, aparecendo mais adiante, elegantemente, num vestido riquíssimo da linha Dolce Gabbana. Romancista é mais ou menos assim. Tem várias identidades, movendo-se diferentemente em cada esquina da vida, mas conservando, com certeza, aquela que é só do autor – ou autora – , característica essencial, aliás, não sendo necessário dizer mais.

Paula Bajer, ao final, conhece os sentimentos humanos e seus segredos como o cirurgião que explora as entranhas no fio do bisturi, costurando-as depois com pontos bem delineados. Ou não.

“Um Enterro para Suzana” está nas livrarias. Edição discreta, texto simples mas caprichado, livro cativante e sedutor, sequenciando “A Carta de Glória”, “Na Delegacia” e “Enquanto os Casais Namoravam no Jardim”.

Lá vai “Um Enterro para Suzana”.

E la nave va.

 

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