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Usinas atômicas (Um crime universal II)

Paulo Sérgio Leite Fernandes

Formigas não vencem elefantes, é o que se diz. Imagine-se, entretanto, um ataque ao paquiderme realizado por milhões daqueles insetos. Evidentemente, a luta antes desigual se equilibra, com vantagem para os pequeninos, pois estes são difíceis de esmagar. A propósito, vale lembrar que a implantação das usinas Angra I e Angra II em Angra dos Reis (logo naquele local paradisíaco) recebeu do cronista, a partir dos primeiros movimentos de instrumentalização, críticas muito raivosas, ineficazes por certo, mas ainda válidas e atuantes. É bom recordar, também, que o ditador Geisel, lá atrás, chegou a pensar na implantação de uma outra usina nuclear em Itanhaém, logo ali, sabendo-se que a localização próxima ao mar é imprescindível à edificação de tais monstrengos. Mais adiante, transcrevendo poesia de Vinícius de Moraes, o cronista rebatia o assunto, provocado pelo pavor gerado com a explosão de Chernobyl. Exemplificava com a França que tinha, já então, trinta e sete usinas atômicas. A formiguinha tinha boa visão de futuro, embora se afirme que aqueles insetos não enxergam. Vendo ou não, os bichinhos se guiavam pelos famosos “feromônios”, responsáveis até mesmo pela maior ou menor aproximação romântica entre homens e mulheres. Vai daí o cronista prenunciava alguma coisa muito ruim. Aconteceu agora no Japão, gerando-se na população – e no mundo inteiro – pavor contagiado pelos eflúvios das entranhas satânicas daqueles monstros iridescentes postos dentro do território japonês. Dizem os nipônicos que o desastre nunca chegará àquelas catástrofes antes concretizadas no mundo. Se Deus houver – tomara que exista – proverá para que a predição não se consume. Rezemos. No entremeio, diga-se que a humanidade é burra, se omissa não for. Aqui, os exemplos alienígenas não servem às lideranças brasileiras. Já quando em início de construção, as usinas atômicas de Angra dos Reis receberam múltiplas críticas, censurando-se inclusive a pouca segurança das edificações ou do aparelhamento protegendo o ventre brilhoso sob a bocarra do anticristo. Curiosamente, as coisas explodem, envenenam gente, matam adultos inseminados enquanto crianças e não respeitam limites nem bandeiras nacionais. Voam ao vento, despinguelando no universo. Entretanto, as nações persistem na maluquice, competindo nas usinas e nas bombas. Dizem os versados em antiguidades que o dilúvio realmente existiu. O relato daquilo vem de fontes muito variadas e não só bíblicas. Houve, realmente, alguma coisa no estilo (extinção de espécies, metamorfose de outras, reformação de continentes e quejandos). Lá no Japão há a tragédia consequente a ajustamentos do subsolo, há o bafejar dos vulcões e existe a repetição de dramas muito remotos, mas não havia, naquilo tudo, o concurso da mão do homem. Agora há. Os homens não aprendem. Parecem estar cansados de ser como são, querendo, quem sabe, transformar-se em mutantes. Chegamos lá. Releia-se Vinícius. Veja-se Ney, o Matogrosso.

Rosa de Hiroshima

Pensem nas crianças
Mudas telepáticas
Pensem nas meninas
Cegas inexatas
Pensem nas mulheres
Rotas alteradas
Pensem nas feridas
Como rosas cálidas
Mas, oh, não se esqueçam
Da rosa da rosa
Da rosa de Hiroshima
A rosa hereditária
A rosa radioativa
Estúpida e inválida
A rosa com cirrose
A anti-rosa atômica
Sem cor sem perfume
Sem rosa, sem nada

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