A surra
Roberto Delmanto
“Seu” Joaquim viera para o Brasil ainda menino e sem recursos. Aqui fizera fortuna no comércio. Homem de meia-idade, era um português alto e muito forte.
Criara os cinco filhos, já moços, dentro de rígidos padrões morais. O mais jovem, de cerca de 20 anos, era o predileto. Herdara do pai, entretanto, além da compleição física, o mesmo defeito que aquele tivera na juventude: era extremamente briguento.
Certa noite, na saída de uma boate, o jovem, depois de injustamente provocado, batera em três rapazes, ferindo-os bastante. Ele próprio, em compensação, não sofrera sequer um arranhão. Agora, estava sendo intimado para comparecer a uma Delegacia.
O português procurou, então, meu pai Dante, contratando-o para defender o filho.
Meu genitor ponderou ao cliente que, embora a provocação houvesse partido das vítimas e estas fossem em número de três, dificultava a defesa o fato de seu filho não ter tido qualquer lesão.
Pai e filho ficaram de voltar no outro dia, quando meu genitor acompanharia o segundo ao Distrito Policial.
Na manhã seguinte, o português telefonou a meu pai, travando-se, na ocasião, este diálogo:
O português: “Doutor, o meu filho não vai poder ir à Delegacia hoje”.
Meu pai: “Por quê?”
O português: “Está acamado”.
Meu pai: “Ele está doente?”
O português: “Ele se machucou”.
Meu pai: “Mas o que aconteceu?”
O português: “É que como o senhor me disse que o que atrapalhava a defesa era ele não ter sofrido qualquer machucado, resolvi arranjar-lhe alguns, e dei-lhe uma boa surra; só que acho que acabei exagerando…”