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Pobre Hebe de Bonafini

* Paulo Sérgio Leite Fernandes
**Gustavo Bayer
Pobre Hebe de Bonafini***

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No auge da repressão ditatorial imposta aos brasileiros, a Ordem dos Advogados do Brasil, Secção de São Paulo, trouxe Hebe de Bonafini da Argentina. Já falei do assunto uma ou duas vezes, porque a visita da “Madre” constituiu, de um lado, demonstração de coragem e, de outro, serviu como estímulo aos advogados brasileiros para a luta redemocratizadora. Hebe, evidentemente, era mais moça e menos robusta que aquela matrona mostrada na “Folha de São Paulo” de sexta-feira, 1° de julho de 2011. Envelheceu, como todos nós. Quando veio a São Paulo, convidada por José Eduardo Loureiro (Presidente da OAB paulista), preferiu estar conosco advogados e estudantes a visitar o governador do Estado. Fomos depois à TV Globo, eu e ela. Entrevistou-nos uma loira magrinha, rápida e bem falante, chamada Marília Gabriela, não a mesma de hoje, pois aquela que vejo em vários programas de televisão, não metodicamente mas quando me falta o sono, é muito mais rebuscada e sutil nas inquirições dos convidados. Faz mais de vinte e cinco anos. Gabriela se sofisticou, Bonafini e eu sobrevivemos. A foto atual da “Madre de Mayo” aponta uma espécie de camponesa antiga tentando vestir-se adequadamente à cidade. Usa ainda o “pañuelo blanco” do qual tenho um exemplar. O outro deve estar com a família de José Eduardo Loureiro, ou com “Dilu”, sua mulher. Aquele lenço branco significava a luta pela libertação da Argentina.

Daquela data a esta a Argentina se livrou dos generais, torturas e carrascos. Nós também, em menor proporção, mas os cemitérios clandestinos de lá e de cá ainda guardam os restos dos “mortos queridos, filhos sumidos nas sombras do nada”.

Hebe aparece nos jornais, agora, em sentido negativo. É casada, ou vive com Sérgio Schoklender, acusado de dilapidar ou desviar dinheiros públicos de um programa denominado “Sonhos compartilhados”, criado pela associação das madres em sintonia com o governo Kirchner. Não se diz que a matrona praticou ilícitos penais mas ela pode ter escolhido mal o seu homem…

Não se usa a vida quase inteira, enfrentando esbirros nas esquinas, para jogar tudo fora no terceiro terço. A “Madre” Hebe de Bonafini continua mantendo seus padrões de coragem, honestidade e perseverança. Seu quase marido pode até não prestar. Pague ele o preço da vilania. Mas Hebe de Bonafini é um símbolo que a Argentina não tem o direito de destruir. Os platinos precisam mantê-la e nela confiar. Infelizmente, constrói-se uma reputação durante décadas, mas nossos totens e ídolos são de barro. Quebram-se facilmente. Isto é uma das desgraças maiores do ser humano.

* Advogado criminalista em São Paulo há cinquenta e um anos.

** Áudio e vídeo

*** O texto é de única e absoluta responsabilidade do autor Paulo Sérgio Leite Fernandes. O intérprete Gustavo Bayer é apenas o ator.

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