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Imprensa libertária (Ou “Quando o denuncismo vira esbórnia bordelística”)

* Paulo Sérgio Leite Fernandes
**Gustavo Bayer
Imprensa libertária
(Ou “Quando o denuncismo vira esbórnia bordelística”)
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Hoje, dificilmente, alguém se põe a estudar alguma coisa em profundidade. Existe um negócio chamado “Google”. O lanterninha do cinema pornô, se quiser, vai à internet e vê o significado de “sexomania figurativa”. A comunicação por computador tomou conta do mundo. É assim. Dentro de tal contexto, basta abrir-se o navegador universal para a localização do significado de “fagocitose”. É uma espécie de mastigação celular, sobrevivendo uns organismos enquanto devoram outros, isto em explicação laica. Vem acontecendo alguma coisa semelhante no Brasil, não dizendo somente com a chamada imprensa falada e escrita, mas com todo o organismo sociopolítico. Há, bem examinando, um sistema de alimentação de setores múltiplos a poder da mastigação de outros. Em síntese, os jornais e as redes de televisão mantêm seus índices de popularidade a poder de notícias diárias de escândalos, não se intimidando com eventual retorsão, porque reações ou resistências se aviltaram na própria covardia dos ofendidos. Exemplo bastante é o esmiuçamento de praticamente todas as áreas da convivência humana no Brasil, sem perdão algum para a atividade de violação dos lares de terceiros. Os saxônicos do tempo de João Sem-Terra tinham uma expressão que se tornou famosa: “– My House, my castle”. O brocardo foi às favas. Curiosamente, a invasão deletéria procura devorar a confiabilidade dos próprios responsáveis pela distribuição da justiça, numa tentativa, dolosa ou não, de desmerecimento da Jurisdição, sem vantagem qualquer, porque a presunção é de que a Suprema Corte seja composta por homens e mulheres cultos, honestos e bem direcionados. Suspeitas e insinuações, hoje dirigidas à Suprema Corte, constituem menor dose de lealdade, pois não se dá ao ofendido, de um lado, a possibilidade de reagir à altura e, de outra parte, se procura trazer o órgão a debate aberto, coisa que um juiz não deve fazer, sob pena de, muita vez, participar de uma espécie de briga de rua em que um adversário cospe no outro. Dentro de tal contexto, o jornalista se comporta como se fora doidivanas absolutamente desprovida de censores, mas que reclama desabridamente quando extrapola os limites máximos da esbórnia bordelística. Diga-se, a liberdade de imprensa deve ser preservada às últimas consequências, mas não se pode desmerecer o conjunto de normas que permitem ao ofendido uma resposta à altura. Desconhece-se no Brasil, agora, decisão qualquer a punir ofensor que se haja utilizado de meios jornalísticos, dos quais faça parte, para difamar, injuriar ou caluniar alguém. De duas uma: ou os juízes têm medo ou o Código Penal, sequenciando a Lei de Imprensa, perdeu qualquer possibilidade de intimidação, desmoralizando-se. Já dizia Nelson Rodrigues, a seu tempo, que “toda nudez será castigada”. É regra renegada ao esquecimento. Havia um velho cidadão, lá nas Minas Gerais, que deixou de lado o matutino parcialmente lido na madrugada, sorveu a xícara de café preto constitutiva da sua rotina diária, foi ao criado-mudo, pôs à cinta o “32” com cabo de madrepérola, entrou na redação do jornal e deu um tiro no escriba difamador. Fazia-se assim na tradição daqueles lugarejos, caracterizando a honra, às vezes, atributo valorizado superiormente à vida. Muitos juízes, presentemente, criaram tese supinamente soturna: o homem público tem pudores diferentes daqueles deferidos ao cidadão comum, porque suas vidas devem estar expostas. Isto é burrice sobrenadante, ou cinismo sofisticado. Justificar-se-ia o argumento, quem sabe, no fato de muitos políticos terem perdido a vergonha, mas sei de gente que, lá nos rincões de Muzambinho, chicoteou o caluniador a relho molhado ainda do suor do cavalo de raça que acabara de desmontar. Ainda se faz assim de vez em quando. É raro, mas acontece.

* Advogado criminalista em São Paulo há cinquenta e dois anos.

** Áudio e vídeo

*** O texto é de única e absoluta responsabilidade do autor Paulo Sérgio Leite Fernandes. O intérprete Gustavo Bayer é apenas o ator.

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