Home » Crônicas Esparsas » Arnaldo Codespoti – Um médico à moda antiga

Arnaldo Codespoti – Um médico à moda antiga

Paulo Sérgio Leite Fernandes

Há na vida humana dois fatos inafastáveis: um deles é morrer. Certo dia, assistindo a missa de 7° dia, ouvi de uma velhinha, no banco da frente, um cochicho com outra: “– Que missa chata. Se eu morrer, não vai ser assim”. Aquela senhora tinha a passagem para o outro mundo como uma probabilidade. É assim pois nós, os outros, os vivos, nos surpreendemos com acontecimentos tais, sem que nos esqueçamos, por exemplo, dos 49 homicídios concretizados em São Paulo no último fim-de-semana, antes de 26 de novembro de 2012. Arnaldo Codespoti é exemplo daquele personagem de “O Físico”, de Noah Gordon: havia um esculápio que não precisava pesquisa outra nos pacientes, apenas apertar-lhes as mãos. Este vai morrer, aquele vai viver. Codespoti era assim. Nós nos acompanhávamos havia 40 anos, a partir de uma febre alta acontecida comigo enquanto ambos éramos jovens. Assim foi, assim ficou. O convívio terminou num enterro a que eu não fui, como o do Luiz Antonio Seraphico de Assis Carvalho e o do Carmo Domingos Jatene. Os três se foram discretamente, sem alarde qualquer ou notícia no jornal. Mereceriam velório à moda viking, incinerados depois sobre uma pira recendendo a arruda. Arnaldo, o doutor Arnaldo, encostou as mãos milagreiras na maioria dos Homens Bons de São Paulo. E nas mulheres também. Sabia tudo. Um velho clínico, certamente. Atendeu-me, mês passado, num domingo à tarde, abrindo o consultório para o derradeiro cliente. Morava perto. Veio devagar, a pé, maleta preta ao lado. Já o percebia enfraquecido. Alguma coisa não ia bem. Medicou-me e recusou carona. Voltou andando, vagarosamente também, como a refletir sobre o fim do caminho.

A vida vai seguindo e os antigos sentem alguma culpa na sobrevivência. Dizem os psiquiatras que o fenômeno é normal. De qualquer forma, a sorte é sempre lançada. Vão-se uns, outros ficam pra contar a história.

Deixe um comentário, se quiser.

E