Autoconvencimento
Roberto Delmanto
Muitos clientes que procuram a nós, advogados criminalistas, preferem não admitir culpa, temendo que, ao saber disso, não aceitemos a causa, ou aceitando, não os defenderemos com o mesmo entusiasmo.
Há outros que se dizem inocentes e neles acreditamos, ou não acreditamos, ou ainda ficamos em dúvida.
O essencial, a meu ver, é que a consciência do criminalista lhe permita aceitar a defesa, mesmo que saiba ou tenha dúvida da responsabilidade do acusado. Desde que possa entender a razão da prática do delito, a sua motivação moral, ética, psicológica ou simplesmente humana, e, por vezes, até perdoar sua conduta…
Há alguns anos, certo empresário me procurou. Denunciado por falsidade documental, admitiu desde logo a sua culpa. Explicou que os prejuízos que a vítima, como seu procurador, lhe causara e os abusos que cometera extrapolando o mandato, o haviam levado a esse ato extremo, praticando, pela primeira vez na vida, um ilícito penal. Condoído de sua situação, aceitei defendê-lo.
Durante as várias audiências de processo, a prova oral foi correndo de forma surpreendentemente favorável à defesa.
Até que, após uma delas, o cliente, que inicialmente a mim se confessara culpado, aparentemente disso se esquecendo, disse-me em alto e bom som: “Doutor, eu sou inocente. Está provado. Sempre fui muito honesto e continuo a sê-lo. Durmo todas as noites com a consciência tranquila”.
Ou seja, com o desenrolar do processo se autoconvencera da sua inocência. Surpreso como inusitado fato, preferi não contestá-lo, mas lembrei-lhe que faltava o mais importante: convencer o juiz…