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Ministério Público se desespera

Paulo Sérgio Leite Fernandes

         Tramitam na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, na Câmara Federal e no Senado, projetos pretendendo restringir os poderes, legítimos ou não, que o Ministério Público, Estadual ou Federal, pouco importa, vem usando na repressão a diversas formas de hipóteses criminais. A instituição, certamente, escolheu representantes cuja função é aquela de tentar influenciar deputados, senadores e o povo, na manutenção do statu quo. Em bom e claro vernáculo, estão desesperados porque, firmados em premissas éticas até razoáveis, os promotores de justiça e procuradores da república se põem na qualidade de salvadores da pátria. Pode ser assim e não pode ser assim. Na verdade, nos períodos que antecederam a Constituição de 1988, o Ministério Público montou praça em Brasília, catequizando os constituintes no sentido de obtenção daquelas prerrogativas hoje usadas, a bem da verdade, com enorme destempero, pois a instituição usurpou atribuições da polícia, mandou prender gente, adquiriu parafernália eletrônica destinada a espiolhar o segredo de comunicações telefônicas e ambientais, compeliu coercitivamente cidadãos a comparecimento em seus gabinetes, algemou criaturas em praça pública, coonestou atividades ilícitas de policiais e editou, nos gabinetes, acolitada por servidores denominados “agentes”, inquéritos policiais disfarçados, antes travestidos de inquéritos civis públicos e agora, descarnadamente fantasiados de “PIC’s” (Procedimentos Investigatórios Criminais). Naquele tempo, na alvorada que antecedeu a Carta Magna hoje vigente e emendada, a OAB se manteve morna, analisando os fatos sem grande energia. Daí, numa ampla movimentação política, os persecutores públicos obtiveram o primeiro pavimento daquilo que hoje é um edifício ensombrecido por excesso de autoritarismo e abuso de poder repetido. A mensagem dos prepostos escolhidos para a refrega é subliminar. Pugnam, em outros termos, pelo dito não enfraquecimento moral da nação. Não se negue, em alguns aspectos, a capacidade, à instituição deferida, de perseguir a chamada criminalidade de alto coturno. Entretanto, é bom frisar que os moços e moças foram longe demais, extrapolando impunemente requisitos mínimos da legalidade na perseguição. Esqueceram-se de que o mocinho, enquanto corre atrás do bandido usando meios ilegais, se transforma na mesma alma ruim, passando a pertencer à família do outro. No meio disso tudo, o Ministério Público tem abonado múltiplos criminosos, tomando-os como colaboradores na pútrida delação premiada, a pior forma de enlaçamento entre anjos e demônios. Foram além dos tamancos, sim, endossando violações do segredo de comunicação entre advogados e seus clientes, incitando buscas em escritórios de advocacia e trabalhando muita vez à margem da legalidade, esquecidos de que o excesso nunca faz bem. Nessa atividade, conseguiram inclusive amortizar o sentimento de liberdade que cada cidadão tem, envolvendo o indivíduo na dita vontade coletiva inebriada com o castigo a ser imposto àqueles que esvaziam os escaninhos dos cofres públicos, os mesmos que transformam o Estado, ocasionalmente, num grande delinquente, porque toma do povo e não devolve o que tomou. Não, é preciso que o Ministério Público nacional, nisto compreendidos todos os seus segmentos, entenda que está pagando – e vai pagar – pelos excessos cometidos, transformando-se então, após penitência, num órgão plenamente útil à reestruturação ética da nação. Dentro do contexto democrático em que o país começou a se reinstalar, não o conseguindo ainda integralmente, o Ministério Público brasileiro precisa ser reordenado, recomposto, redimensionado enfim, convencendo-se, a poder de mudanças legislativas, das contas que deve prestar e das limitações indispensáveis ao exercício de suas atribuições. Quando todos os criminalistas brasileiros esbravejam aqui e ali, cada qual exibindo ferimentos graves produzidos pela exorbitância das perseguições a seus clientes, o contraditório penal vai muito mal. Em tais contingências, não se sabe se a corporação profissional dos advogados, agrupando 740.000 inscritos, está a examinar o conflito políticoideológico com preocupações maiores quanto à reformulação do comportamento persecutório em vigor. Entretanto, não é hora nem momento de os advogados se distanciarem da refrega. As mutações legislativas prenunciadas hão de ser examinadas a fundo, vigiando-se a evolução afincadamente numa cooperação hábil a que promotores de justiça não se transformem em usuários de poder desmesurado conducente a arbítrios blindados contra censuras externas.  Esclareça-se, nesse passo, que o Ministério Público, no organograma legislativo da nação, é o único órgão que se exime de controle externo enquanto não faz. Em síntese, é senhor da própria omissão. Valha o reparo, portanto, para não se dizer que a voz dos advogados foi emudecida pela mesma letargia que provocou, nos idos da constituinte, o desequilíbrio, agora mordente, entre acusação e defesa.

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