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O pulo do gato

Roberto Delmanto

Os advogados criminalistas, assim como faziam os artesãos da antiguidade, não costumam transmitir os segredos de sua nobre arte por escrito, mas apenas oralmente e só para descendentes que seguirem a especialidade ou discípulos preferidos. É a tradição oral.

Evandro Lins e Silva e Antonio Evaristo de Moraes Filho foram dois dos maiores advogados criminais do Brasil no século passado. Evandro, de uma geração anterior e Evaristo, da seguinte, tendo trabalhado com o primeiro no início de sua carreira.

No auge profissional, ambos se defrontaram no processo de impeachment do ex-presidente Collor. Evandro como advogado dos autores do pedido e Evaristo como defensor. Apesar da amizade que os unia, durante o processo tiveram algumas rusgas, comuns nos grandes embates forenses.

Com a decretação do impeachment e a vitória de Evandro, os jornalistas foram entrevistá-lo e um deles perguntou o que achava de Evaristo, ao que o mestre respondeu: “Ele é hoje um dos principais criminalistas do país. Quando trabalhou comigo já era muito talentoso e eu lhe ensinei tudo o que sabia”. E, para deleite dos repórteres, acrescentou com um sorriso: “Só não ensinei o pulo do gato…

No processo criminal perante o Supremo que se seguiu – o mais importante da história até hoje – Evandro não participou, tendo Evaristo defendido Collor mais uma vez. Como advogado do ex-Secretário da Presidência na mesma ação penal, pude acompanhar a brilhante estratégia de Evaristo.

Justificou os gastos do ex-Presidente com as sobras de campanha, de domínio público, pois decorrentes do receio das elites, à época, da ascenção de Lula. Por outro lado, descaracterizou a acusação de corrupção passiva, mostrando que não existia prova de qualquer ato de ofício por parte do ex-Presidente, ou seja, um ato governamental ou promessa dele em contrapartida a valores supostamente recebidos, imprescindível para a configuração do tipo penal.

Com a absolvição de Collor no Supremo, apesar de Evandro não lhe ter ensinado, foi a vez de mestre Evaristo dar o seu pulo do gato…

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