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Apedrejamento de Mulheres no Irã – Sakineh está livre

* Paulo Sérgio Leite Fernandes
**Gustavo Bayer
Apedrejamento de Mulheres no Irã – Sakineh está livre***

Em agosto de 2010, este “site” se uniu a uma campanha mundial visando salvar a vida de Sakineh Mohammadi Ashtiani, acusada, no Irã, de praticar adultério com dois homens. Aquilo, naquele país, era punido com lapidação, ou seja, apedrejamento até a morte, enterrando-se a criatura até o pescoço. O povo recebe pedras já devidamente recortadas, com tamanho assemelhado. Alguém sempre atira a primeira. Em seguida, a cabeça da infeliz é transformada em massa informe, tudo porque foi pra cama com homem que não era o seu. Que desgraça, que contradição imensa se e quando comparado o fato com os costumes e leis brasileiros. Aqui, numa absolutamente democrática legislação, homem e mulher se casam hoje e se divorciam amanhã, em Cartório, levando imensa preocupação aos responsáveis pelo distrato, pois casamento e divórcio podem ser uma forma de lavagem de bens. O marido precisa proteger o patrimônio e, na separação, tenta passar tudo à mulher. Houve tempo em que isso era possível, com alguns dissabores, pois a moça tinha o homem, literalmente, aos seus pés. Mas isso, agora, não é importante. Basta dizer que a campanha visando salvar Sakineh, com humilde concurso deste “site”, a levou a sobreviver e agora, exatamente ontem, 18 de março de 2014, a adúltera foi posta em liberdade. Que resultado bonito. Parece que a decisão foi tomada por personagem que, no Irã, protege os direitos fundamentais do ser humano. Felizes estamos.

Aqui no Brasil, em período não muito distante, havia sanções criminais e morais a quem praticasse o adultério. O cronista se lembra, muitos e muitos anos atrás, quando jovem, de ter sido contratado por um corno para pegar em flagrante a mulher, que estaria a fornicar com o amante num hoteleco (não havia motéis). Fez-se tudo nos conformes: a polícia, a surpresa e a constatação. O escriba nunca se esqueceu da jovem adúltera. Era linda. Colhida naquilo que se chama o supremo amplexo íntimo, cobriu-se com o lençol. Desesperada, agarrou-se às pernas do advogado, pedindo pelo amor de Deus que não levasse a diante a autuação. O corno (expressão posta nas Ordenações do Reino e, portanto, utilizável), babava enraivecido. O outro estava abobado, sem saber o que faria. O advogado, estupefato, procurava desvencilhar-se. Conseguiu-o. Dirigiu-se ao cliente iracundo e lhe disse: “- Passe no escritório para pegar os honorários em devolução. Isso é demais pra mim”.  E se foi a pé, pelas ruas escuras, absorto sim, mas penalizado também. Nunca mais admitiu, na especialidade criminal, cuidar de acontecimentos análogos. Daí adiante, duas eram as causas que rejeitava: o tráfico de entorpecentes e briga de casal.

O Brasil hodierno tem vocação absolutamente libertária a respeito da fornicação. A Suprema Corte admite o casamento entre pessoas do mesmo sexo, ofendendo as escrituras porque, biblicamente, a união entre casais se destina ao fazimento de filhos. O Supremo Tribunal Federal não quer saber de tais assentamentos religiosos. Homem com homem, mulher com mulher. E vamos adiante…voltando-se à iraniana salva da lapidação, faça-se comparação com nosso país: imagine-se casal formado por homem e homem, ou mulher com mulher, litigando na justiça em função de adultério. Um divórcio litigioso, cuja base é a ofensa ao dever de fidelidade. No meio disso, hipóteses de violência física e o chamamento da Lei Maria da Penha. É esquisito, mas possível. E viva a Sakineh.

* Advogado criminalista em São Paulo há cinquenta e quatro anos.

** Áudio e vídeo

*** O texto é de única e absoluta responsabilidade do autor Paulo Sérgio Leite Fernandes. O intérprete Gustavo Bayer é apenas o ator.

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