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Mal caminha o processo penal pátrio

Paulo Sérgio Leite Fernandes

O vazamento, em Vara Federal do Paraná, de depoimentos prestados na chamada “Operação Lava-Jato”, informações estas projetadas pela imprensa no Brasil inteiro, constitui, queira ou não queira o eminente Juiz exercendo jurisdição naquelas ações penais, retumbante interferência no processo eleitoral brasileiro. Na verdade, o entreato vertendo na disputa à presidência é sumamente sofisticado, interferindo na motivação dos eleitores, desde uma possível verruga no nariz de um concorrente até uma circunferência maior na cintura de outra. Tudo vale. Mais valor tem, ou influência, a quebra de sigilo correspondente a possível defeito moral, ético ou negocial atinente aos pretendentes ou partidos. Tocante ao Juiz Sérgio Moro, respeitadíssimo por sinal, qualquer brasileiro menos versado no Direito ou nas artes da comunicação diria que o desbordamento dos autos é, no mínimo, inoportuno. Poderia esperar, não se interferindo, então, no panorama exibido pela votação. Não há o mínimo risco de prescrição. Aquilo tudo vem enrolado na denominada “delação premiada”, enredada por sua vez na colaboração, constituindo tal atividade um dos mais nefandos acidentes de percurso da legislação processual penal brasileira, vinculada esta última à premiação dos delatores. Pior que isso, se coisa pior puder haver, é a denominada interceptação telefônica e ambiental, fruto de uma séria derrapagem de processualistas penais pátrios, sabendo-se que estes, não valendo a pena nominá-los, hão de carregar a imprudência ao resto das respectivas existências. Assim, o oferecimento ao Brasil de depoimentos atingindo este ou aquele partido político é apenas incidental – um enlameamento ético menor, se e quando existindo – no entremeio do amolecimento moral das relações entre autoridades repressoras e possíveis delinquentes, característica esta advinda de Roma antiga, justificando o brocardo “Nemo potest propriam turpitudinem allegare”, ou seja, ninguém pode se beneficiar com a própria torpeza (tradução livre). O sistema processual penal brasileiro há de demorar um decênio para se livrar dessa dupla peste. Assim, as providências publicitárias daquele juiz federal cedem passo a realidades muito mais sérias referentes à intimidade da cidadania, sabendo-se de empresas especializadas nesse tipo de coisa trabalhando, inclusive, numa espécie de reserva de mercado suspeitosa. Nem se fale na gravação de parlatórios onde presos realizam, com suas consortes, companheiras ou até mulheres de ocasião, o chamado transcurso sexual, atividade que se básica não for à espécie humana e à zoologia universal, é quase.

Tocante ao chamado abaixo-assinado de criminalistas brasileiros ao Conselho Federal da Ordem dos Advogados buscando providências quanto ao juiz Moro, endosso-o com prazer, embora entendendo que o presidente nacional da Corporação não precisa de estímulo algum para fazê-lo. Já deveria tê-lo feito, se já não o fez. Melhor agirá, certamente, se abranger no protesto todo o corolário virulento posto na atividade probatória correspondente à perseguição de ditos infratores. Isso tudo cheira muito mal há muito tempo. Desgraçadamente, como toda arbitrariedade envolvente, a higienização do processo penal pátrio exigirá uns dez anos para acontecer. É pior, o fenômeno, que uma peste malsã. Não há, no momento, antibiótico eficaz ao combate a tal virose. Haveria sim: o país tem quase um milhão de advogados, só agora sacudidos da inércia pelos poucos criminalistas subscritores do manifesto. É insuficiente, mas vamos lá!

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