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PAULICÉIA ABANDONADA

Roberto Delmanto

A advocacia criminal é uma mulher muito exigente e ciumenta, que não admite concorrência.

Dedicando-se a seus clientes plenamente, os criminalistas por vezes se esquecem dos próprios afazeres.

Foi assim que, por ter deixado de fazer a prova de vida, acabei não recebendo por algum tempo minha aposentadoria do INSS, que acabou se acumulando.

Resolvi, então, fazer a tal prova, agendando para tanto uma data na autarquia, me tendo sido indicada a agência central da rua Xavier de Toledo, na Capital paulista.

Com a pré-falência da Previdência e as dificuldades para sua indispensável reforma, confesso que para lá me dirigi um tanto ressabiado.

Ao chegar, todavia, minha surpresa foi total. O antigo e espaçoso prédio estava muito bem conservado e limpo. Embora houvesse poucos funcionários para o número de balcões de atendimento, na hora marcada fui muito bem atendido por um gentil funcionário formado em filosofia (aquela cujos cursos Bolsonaro quer acabar). Em pouco tempo, meu cadastro foi atualizado e reativado, com a cobrança do crédito que tenho. Tudo eletronicamente.

Se a ida ao INSS foi uma ótima experiência, o mesmo não ocorreu em suas cercanias.

Entre dois prédios bem conservados – a Biblioteca Mário de Andrade e o Teatro Municipal, e ainda o simpático Shopping Light, instalado no edifício da antiga companhia de energia  – as ruas Xavier de Toledo e 7 de Abril pareciam ter passado por uma guerra.

Calçadas esburacadas pela falta de conservação ou por buracos abertos pela SABESP ou outras empresas públicas ou terceirizadas sem o respectivo reparo, ao lado de dezenas de moradores de rua, inclusive crianças.

O descuido da Prefeitura é total, não havendo qualquer ação social para cadastrar seus moradores, avaliar suas condições e propor soluções.

Na ida e na volta do bairro para o Centro, outra constatação. Bicicletas e patinetes alugados transitam na contramão, sendo depois deixados nas ruas para recolhimento noturno pelas firmas locadoras. Caminhões dos mais variados tamanhos circulam aparentemente sem qualquer restrição de horário.

Ainda no Centro, a conservação de alguns prédios históricos e a mudança de poucos órgãos estatais para lá, embora louvável, têm sido insuficiente, com a maioria dos edifícios particulares pichados e depredados, quando não abandonados.

Talvez fosse viável a propositura de uma lei que isentasse do pagamento de IPTU e INSS, por vinte e cinco ou trinta anos, as empresas privadas que para lá se mudassem com o compromisso de, por igual tempo, restaurar e conservar os prédios, inclusive suas calçadas.

Que o INSS continue melhorando e que a inadiável reforma da Previdência seja aprovada da forma mais juta e humana possível.

Pobre, contudo, da nossa querida Paulicéia, que já foi orgulho de seus moradores, que é motor do Estado que é o motor do país, a maior metrópole da América do Sul, que historicamente sempre recebeu e continua recebendo de braços abertos todos os imigrantes que aqui chegam – mas que se encontra hoje tão tristemente abandonada…

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