O SUSTO DO PSIQUIATRA
Roberto Delmanto
A quantidade de droga apreendida com uma pessoa não mostra que ela seja, necessariamente, um traficante, devendo ser analisadas outras circunstâncias como seus antecedentes, conduta social e meio de vida.
Foi o que aconteceu com aquele jovem de classe média alta. Para não se expor em demasia, costumava comprar um volume maior de entorpecente para seu consumo pessoal.
Certo dia, ao tentar adquirir uma quantidade mais significativa, foi preso em flagrante e autuado por tráfico. Informado pela família que me procurou que o rapaz era viciado desde a adolescência, solicitei a um conceituado psiquiatra que o examinasse. O médico concordou em ir comigo até o Centro de Detenção Provisória em que o moço se achava. Fomos recebidos por uma psicóloga, sua admiradora, que após cumprimentá-lo com entusiasmo, se prontificou a levá-lo até o jovem. Explicou-me que eu, por ordem do diretor, não poderia acompanhá-los, com o que concordei, pois queria deixar o psiquiatra à vontade.
Cerca de cinco minutos depois, o médico, totalmente pálido, voltou à portaria em que eu me encontrava. Nervoso, disse-me que tivera de passar por um corredor com várias celas, temendo que nelas pudesse estar algum preso para o qual tivesse dado um laudo reconhecendo a sanidade mental e, em consequência, sua imputabilidade penal.
Falei pelo telefone interno com o diretor, explicando-lhe a situação e ele autorizou que o rapaz fosse levado até uma sala próxima à entrada. Para dar “uma força” ao assustado médico, acompanhei-o até ela, onde o moço foi longamente examinado.
Concluiu o psiquiatra que ele entendia o caráter criminoso do fato, mas não era, todavia, inteiramente capaz de determinar-se de acordo com esse entendimento. Deu, então, um parecer médico-legal pela sua semi-imputabilidade, possibilitando a redução de eventual pena.
O cliente acabou sendo absolvido por inexistir prova suficiente da traficância, não sendo a acusação sequer desclassificada para posse, já que a tentativa de compra fôra frustrada pela polícia.
Os pais do jovem, que durante o processo me ligavam diariamente, não me agradeceram. Compreendo que os ex-clientes e seus familiares não queiram reencontrar o criminalista que os representou, desejando esquecer o sofrimento pelo qual passaram. Mas um simples telefonema com um “muito obrigado” seria o mínimo que deveriam ter feito…
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