O NÚMERO DA RUA
Roberto Delmanto
O empresário goiano herdara a tradicional indústria do avô. Apesar de sua dedicação e competência, em uma dessas cíclicas crises econômicas ela se tornou inadimplente. Na época não havia a possibilidade da recuperação judicial de hoje e a empresa foi à falência.
Enquanto o processo falimentar tramitava, o empresário, para sobreviver e sem desviar qualquer bem da falida, montou outra indústria similar em Campinas.
Para se resguardar, pôs a nova empresa em nome de um terceiro e não colocou nenhuma placa na fachada, de modo que o endereço só podia ser identificado pelo número da rua.
Denunciado por um credor, o juiz da falência desconsiderou a personalidade jurídica da nova firma e determinou a arrecadação de seus bens. Quando o empresário soube o que estava ocorrendo, uma carta precatória já tinha sido expedida para Campinas a fim de cumprir a decisão judicial.
Muito aflito, me procurou. Expliquei-lhe que o caso não era criminal e indiquei um renomado falencista.
Algum tempo depois, fiquei sabendo que, informado pelo empresário da iminência do cumprimento da precatória e de que a empresa não possuía qualquer identificação na sua porta, mas apenas a numeração da rua, o colega deu-lhe um insólito conselho: “troque o número por outro”.
Foi o que o empresário fez na mesma noite. O oficial de justiça apareceu algumas semanas após e, não encontrando a numeração que constava do mandado, certificou que não localizara a firma. O empresário pôde, então, continuar trabalhando, dando emprego a dezenas de pessoas e sustentando sua família.
Como o grande magistrado carioca ELIEZER ROSA, chamado de “o bom juiz”, disse certa vez a respeito dos criminalistas, mas que também se aplica aos falencistas, todos “têm um pouco de diabo e muito de anjo…”
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