Home » Crônicas Esparsas » Para meu amigo Antônio Ruiz Filho

Para meu amigo Antônio Ruiz Filho

Paulo Sérgio Leite Fernandes

Recebi cópia do seu artigo publicado no Migalhas. Há críticas à OAB, a maioria bem ajustada, na medida em que nós, advogados, temos trabalhado com a diplomacia que sempre nos caracterizou. Em síntese, a censura não deve ser feita aos presidentes, mas a todos, cada qual responsabilizável individualmente pela nossa realidade. Tocante à atividade política das lideranças nos Conselhos, sem exceção do federal, não me impressiona minimamente o pedido de impeachment do Presidente da República. Não foi preciso ter coragem para fazê-lo, pois a coletividade toda queria o mesmo. Ficou como um baile de carnaval. Fantasias diferentes, mas a marcha era a mesma. É só seguir o caudal, imitando, inclusive, anterior pretensão posta quanto a Dilma por dois ilustríssimos colegas nossos. Se me perguntar se estou descontente com o caminhar da advocacia, estou sim. Entretanto, não me poupo, pois faço parte do todo. Somos em São Paulo quase quatrocentos mil profissionais tíbios, resmungões atrás das portas, medrosos do que pode acontecer se houver resposta agressiva aos reclamos contra o Poder Judiciário e Ministério Público. Em tal contingência, o Estado de São Paulo tem mais de 220 subsecções, todas quietas sim, buscando cada qual uma códea de pão para sobrevivência. Aliás, não basta que a advocacia bata às portas do Conselho Nacional de Justiça fazendo reivindicações desatendidas ou respondidas com milongas. Tenho observado as manifestações dos presidentes do Conselho Federal. São macios. Houve, ali, quem pretendesse o Supremo. Espalhadas pelo país, há outras 26 seccionais*, também burlescamente mudas. Parece que o Espírito Santo está brigando quanto a revistas pessoais nos fóruns. Se assim for, é a única a fazê-lo, porque nós já nos acostumamos a humilhações variadas, inclusive a esta, com descumprimento de resolução do CNJ, no sentido de que todos, mas todos mesmo, devem passar por tal averiguação. Diga-se, além, disso, que em qualquer solenidade na qual a Ordem esteja presente, o advogado é o último a ser convidado, em sobrando lugar.

Não me entenda mal: almoxarifes fazem greve, policiais fazem greve, médicos largam o bisturi, serventuários param a Justiça, sindicalistas se revoltam, moradores de rua – até moradores de rua – protestam, enquanto se veem escritórios de advocacia nos fundos de barbearias, ou até mesmo nas dobras de muros escuros. Você se queixa da Ordem. Eu me queixo de mim, espécie de personagem a açoitar as costas com o cilício, castigando o pecado da quietude.  Prossigo: quando a gente se queixa, rezingando contra os opróbrios  sofridos, aquilo não passa de um bosquejo – ou bocejo –, aguardando cada qual o surgimento de um milagre sempre ausente. Somos 27 seccionais no país, constituindo um milhão de advogados postos na rua, em boa parte, a poder de corrupção – e corrupção é – traçando muitos anos no Ministério da Educação, antes Educação e Cultura, sem que a Ordem faça coisa alguma além de votar contra, nem sempre. Aquilo apodreceu, meu caro Antônio Ruiz, permanecendo putrefato nas vizinhanças do próprio Ministério Público Federal, que comete, ali, uma das maiores faltas já praticadas pela instituição, ou seja, o fechamento dos olhos ante o aviltamento da beca. Se você me perguntar qual é o demérito do Ministério Público no Brasil vertente, eu lhe direi que é a perda da capacidade de sentir o olor ruim bafejado naqueles portais do aperfeiçoamento intelectual dos nossos moços. São fornadas de bacharéis transformados em mendicantes, grupos estrangeiros interessados no ensino do nosso Direito. E aquilo continua assim, meu querido Antônio Ruiz, preferindo a OAB pedir um impeachment que todo mundo quer, acompanhando fila enorme de componentes da cidadania. Nas críticas que fazemos há um pedaço grande de culpas individuais. Hoje, octogenário, a vida me deu a plenitude da pretensão. Posso, portanto, ser mais agressivo que vocês, mais malcriado, mais transparente, mais ácido, mais verdadeiro, mais indiscreto, mais verrumoso, posso ser, sim, muito mais do que você, limitado pelas farpas cercando caminhantes mais jovens. Receio acentuar, amicíssimo Antônio Ruiz, que você não chega lá. Para alcançar o fim dessa estrada, há de precisar ser violento, esmurrando, entre outras condutas, os portais daquele Ministério da Educação que, não se sabendo por quais cargas d’água, compartilhou durante muitos e muitos anos toda sorte de ofensas à educação dos nossos meninos, largando-os à saída de instituições de ensino forjadas pela cupidez de corruptores, sendo tais crimes piores que os ditos alcances à economia da nação. Quando um moço é educado para o ajoelhamento frente à autoridade, tremendo ao simples voejar da toga, há uma geração toda perdida para o futuro. Faz-se isto, nós sabemos. Pior que tracejar maldades sobre os chifres de bois de exportação, amigo Ruiz, é injetar nos estudantes de Direito o temor ante os esbirros e acusadores em geral. Não, queridíssimo Antônio Ruiz, você não há de chegar a lugar algum se não enfrentar tais desafios com dose extrema de agressividade. Nós advogados precisamos de um arauto messiânico, disposto às últimas consequências para tentar reconduzir a advocacia, daqui a uns 20 anos, a condições razoáveis de respeitabilidade. Um messias, talvez, desassombrado na condução da classe, a porradas, se necessário for, perfilando caminho consentâneo com o amor que temos pelos negros panos a nos servirem de armadura hoje, ou de mortalha amanhã. Se você tiver tal condição, estimadíssimo amigo, diga-o. Serei seu companheiro, seguidor, acólito e admirador. Não seu, mas de todos os líderes assemelhados. Faltando-lhe tais características, essas compulsões enfim, faça como eu, a me recolher, num canto, por incapacidade, agora avoengo, de vergastar aqueles que têm, seguidamente, envergonhado nossas vestes sagradas. Digo com sinceridade: já vi no passado quem resistisse bravamente ao turbilhão ditatorial assolando o país. Nossos heróis já se foram. Não conseguimos, sequer, exercer nosso direito de falar sentados na Suprema Corte do país. E aguardamos que a presidência daquele Sodalício (a Suprema Corte), voluntariamente, nos dê aquilo que temos o poder legal de exigir, todos conscientes de que faremos, em novembro deste ano, uma Conferência Nacional repetidora de palavras cheias de redonduras mas vazias de realidade. Nessa dimensão, Antônio Ruiz, venha, se quiser, mas venha reivindicando, na abertura da Conferência Nacional, que a Justiça nos outorgue o assento ao lado do rei, à maneira do Ministério Público, assegurando-nos a qualidade de não sermos apalpados pela gendarmeria à entrada dos Palácios da Justiça, cujos tijolos foram igualmente erguidos por nós. Dispondo-se a isso tudo, queridíssimo irmão, voto em você e em quem mais se dispuser a tanto, sem matreirices,  titubeios ou sussurros atrás das portas. Vamos lá, vocês todos, os 27 presidentes de seccionais, você bastonário máximo da corporação de advogados, vocês centenas de presidentes de subsecções espalhadas pelo Brasil. Se nosso latim não for suficiente, vamos à guerra, na medida em que muita vez não se consegue paz a não ser vertendo sangue na estrada. O tempo deste velho marinheiro já passou. Agora, é a hora e vez dos ungidos. Ou não. Ver-se-á**.

 

*Teimo em usar Seccional.

**Texto remetido, também, a todas as Seccionais do país.

Deixe um comentário, se quiser.

E