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OS QUADROS

Roberto Delmanto

O pai, um grande colecionador de quadros, dera para o filho mais moço, que sempre o acompanhava por ocasião das aquisições, três deles de grande valor.

 

Pouco antes de falecer, no hospital em que estava internado, doou por escritura pública para o filho mais velho, o restante da valiosa coleção, mais de noventa quadros.

 

Após a morte do genitor, o mais moço, com apoio da mãe, tentou anular a escritura, alegando que o pai não estava em seu juízo perfeito na oportunidade da sua lavratura. Não teve êxito, porém.

 

Certa noite, os noventa e tantos quadros, que continuavam guarnecendo as paredes da casa do falecido, desapareceram. Provavelmente com um estilete, haviam sido cuidadosamente retirados de suas molduras, que restaram vazias como esqueletos…

 

As suspeitas logo recaíram sobre o irmão mais novo, que negou veementemente qualquer envolvimento no furto.

 

O mais velho, para apurar o ocorrido, requereu a instauração de um inquérito policial, tendo eu defendido o caçula.

 

Inúmeros mandados judiciais de busca e apreensão foram expedidos; o apartamento de meu cliente e outros locais que ele frequentava, inclusive na Argentina, foram revirados de alto a baixo, sem que os quadros fossem encontrados.

 

Tempos depois, o mais moço morreu tragicamente em um acidente de trânsito.

 

Sua genitora, que era muito ligada a ele, após a missa de sétimo dia foi morar no apartamento do filho morto, passando a ocupar o quarto e a cama deste.

 

Durante uma semana ficou prostrada, sem deixar o leito.

 

A empregada pediu-lhe, então, que se levantasse para que ela pudesse, ao menos, trocar os lençóis, com o que a velha senhora concordou.

 

Ao refazer a cama, a doméstica resolveu virar o colchão. Foi aí que encontrou, debaixo do estrado, cuidadosamente guardados, em perfeito estado de conservação, todos os quadros desaparecidos.

 

A mãe, muito aflita, me telefonou em seguida, perguntando o que deveria fazer. Orientei-lhe a comunicar imediatamente o achado à Justiça, por intermédio de sua advogada civilista.

 

Foi o que ela fez no dia seguinte, ávida que estava em se desfazer, o quanto antes, dos malfadados quadros.

 

Uma dúvida permaneceu: será que os quadros sempre estiveram debaixo do estrado ou o cliente, após a busca em seu apartamento ter sido negativa, para lá os levou, a fim de, como fazem os amantes das pinturas, poder, solitariamente, contemplá-las todos os dias…

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