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Os cães pensam que pensam – Thays Martinez lança obra na Livraria Cultura

* Paulo Sérgio Leite Fernandes
**Gustavo Bayer
Os cães pensam que pensam – Thays Martinez lança obra na Livraria Cultura***

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Tenho um casal de cães, Baltasar Sete-Sóis e Blimunda, em homenagem a José Saramago (“Memorial do Convento”). Os apelidos não são humilhantes. Significam, ao contrário, uma enorme devoção aos personagens genialmente criados pelo pranteado Prêmio Nobel de Literatura. Comecei a ler, em janeiro deste ano, manual de psicologia editado pela Fundação Calouste Gulbenkian: é um tijolão traduzido para a língua portuguesa, mas conforme o vernáculo lusitano, forma até estimulante de não dormir. O livro cuida, primacialmente, da relação entre os humanos e os animais ditos inferiores, citando exemplos altamente meritórios, inclusive, sobre o comportamento das formigas. Há nos formigueiros, com certeza, uma organização de fazer inveja aos humanos, isto não significando, até prova em contrário, que aqueles insetos raciocinem. Tocante aos cães, disse-me uma tratadora que “eles pensam que pensam”. Perguntem o mesmo a Antônio Fernando Costella, brilhante xilogravurista e parceiro, durante muitos anos, do cão Chiquinho, com quem viajou pela Europa inteira, contando histórias comoventes em publicações muitas vezes esgotadas. Chiquinho já morreu, segundo consta, sendo inumado com honras e túmulo particular.

Vale a introdução para breve comentário sobre a relação entre Thays Martinez e seu cão-guia de nome Diesel. A moça ficou cega aos quatro anos de idade e lança, agora, seu terceiro livro sobre a ligação e sobre os atributos do cachorro guiador. Thays entrou em destaque depois que começou a brigar com o metrô de São Paulo, pois a empresa não permitia que o cão a acompanhasse e a conduzisse aos vagões. Moça corajosa aquela, obrigando o metrô a admitir aquilo que, no final da contas, era direito de uma criatura merecedora de atenção especial. Thays Martinez é advogada. Existem outros profissionais do direito em condições assemelhadas. A jovem é bonita e elegante, como se vê na fotografia extraída da internet. A foto é comovente. Diesel, ao lado, parece estar posando para o instantâneo.

A advogada, dentro de seu drama, pôde ver até os quatro anos, circunstância a lhe permitir, a longo prazo, aperfeiçoamento maior em seu contato com o mundo, diferentemente de Helen Keller, cega de nascença e uma grande defensora dos direitos dos seres humanos com exigências assemelhadas.

A briga de Thays pelo livre acesso a órgãos públicos e recintos de diferentes finalidades parece já ter terminado. Tempos atrás, sustentando na Suprema Corte, eu protestei contra a inexistência de assento para os advogados junto à tribuna, anotando, ali, a falta de ladeira para defensores prejudicados na locomoção, eu que aos setenta e cinco anos ainda consigo velejar um pouco e chutar desengonçadamente usando o pé esquerdo. Imagine-se, referindo-me agora a colegas sacrificados na deambulação ou na visão plena, os problemas gerados pela desobediência a providências tão simples. Do meu lado, com cinquenta e um anos de advocacia criminal exclusiva, nunca, mas nunca mesmo, pude ver um advogado, becado, sustentando na tribuna com o fiel cão ao lado. É esperar para assistir. De repente, ante uma decisão injusta e sentindo a angústia do dono, o fidelíssimo companheiro se põe a uivar e até a latir, dando prova de seu desconforto.

* Advogado criminalista em São Paulo há cinquenta e um anos.

** Áudio e vídeo

*** O texto é de única e absoluta responsabilidade do autor Paulo Sérgio Leite Fernandes. O intérprete Gustavo Bayer é apenas o ator.

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