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É pena, mas Ustra escapa

Paulo Sérgio Leite Fernandes

A Ministra Nancy Andrighi foi relatora, em 21 de agosto passado, do Recurso Especial sob número 1.434.498 interposto pelo denominado “Coronel Ustra” contra decisão que julgava procedente ação destinada a apurar práticas de tortura no período negro da história do Brasil inaugurado em 1º de abril de 1964. Pretendia-se, embora no cível, a responsabilização futura do coronel por sevícias e comportamentos assemelhados praticados contra Maria Amélia Telles, Cesar Telles e Criméia de Almeida, presos e torturados no DOI-Codi. A decisão da justiça paulista fora favorável aos autores. Daí o recurso especial do coronel.

O julgamento ainda não terminou. O Ministro João Otávio de Noronha votou com a relatora. Paulo de Tarso Sanseverino, o último, pediu adiamento.

A questão jurídica é complicada porque, se a lei de anistia passou borracha no passado, impedindo ações penais contra os torturadores, restaria saber se no campo extrapenal haveria sequela perdurando.

Evidentemente, a lei referida obsta processos criminais contra as criaturas referidas, havendo, além disso, prescrição em abstrato, porque os sobreviventes torturadores têm, hoje, setenta ou mais anos, cortando-se o prazo pela metade. No cível a disputa é sofisticada, mas a Ministra Nancy parece entender que a lei anistiadora apaga até mesmo a possibilidade de ressarcimento material e moral. Repita-se, há um pedido de adiamento. Se e quando retornar o processo a julgamento com voto divergente, ainda assim o ponto de vista da relatora estará prevalecendo. Nesse diapasão, Ustra escapa, também na competência civil. Não se diga que a vontade do povo brasileiro seria outra. Até pode ser, inclusive a do cronista, mas a decisão do Superior Tribunal de Justiça, embora ainda não definitiva porque há adiamento e possibilidade de voto vencido que, na próxima sessão, poderá ser vencedor, é difícil mudança, a menos que o terceiro juiz, Paulo de Tarso Sanseverino, possa convencer um dos precedentes.

A Lei de anistia colocou sobre os ombros dos envolvidos no negror da ditadura um manto protetor inafastável. Por respeito àquilo (a Lei), embora torcendo o nariz, o jurista precisa curvar-se. Os asseclas do regime ditatorial têm, acredita-se, um preço caro a pagar. Pagam-no em cada rua, em cada esquina, em cada comunhão social. Já é alguma coisa, se mais não houver.

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