Lewandowski, um Ministro sempre Advogado

 

 

 

Hoje, 11 de abril de 2023, o Ministro do Supremo Tribunal Enrique Ricardo Lewandowski se aposenta oficialmente, antecipando datas. Justifica: há razões acadêmicas e profissionais a tanto. Num sentido bem pragmático, Lewandowski volta à vida privada, podendo exercer a advocacia com os impedimentos de estilo.

 

Todos os seres humanos têm história, contada ou não depois, mas sempre um trajeto começando, inclusive, no próprio ato de gestação e projetando seus contornos, às vezes, por muitos séculos. Basta, a servir de exemplo, a rememoração da vida de um escravo romano que se tornou um príncipe, ou, ao contrário, de um imperador que foi às galés. Antigamente havia os anciãos é claro, mas em minoria. Passávamos a outras vertentes em função das pestes, de doenças tradicionais, de acidentes de percurso nas carroças ou bigas e até de picadas de cobra. Em suma, morria-se mais depressa. Hoje em dia, um magistrado prestante tem aposentadoria compulsória aos 70 anos, exceção posta para Ministros do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal de Contas da União, ampliando-se o tempo para os 75. Há razões para isto, mormente porque nós humanos pensamos com o cérebro e não com as pernas. Peça-se perdão pela rudeza do raciocínio. De qualquer maneira, Enrique Ricardo Lewandowski deixa a Corte Suprema nesta data, repita-se. É Ministro há 17 anos. Sua origem é a advocacia, diga-se, porque ungiu a toga pelo Quinto Constitucional, nomeado por Orestes Quércia. Dali se tornou Desembargador depois de passar pelo Tacrim. Exercia a desembargadoria no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo quando, pelas mãos de Luiz Inácio Lula da Silva, preencheu cargo na Suprema Corte.

 

Seria importante trazer à tona uma ou outra porção da vida do Ministro Lewandowski. Seu currículo é extenso. (https://portal.stf.jus.br/ministro/presidente.asp?periodo=stf&id=41). Afirme-se que foi um excelente pretor, merecendo respeito e afeto da classe jurídica, com relevo para toda a advocacia brasileira. Este antigo criminalista, ombreando com vetustos companheiros, tem a virtude ou qualidade de se manter, teimosamente, no uso da beca com que pela primeira vez atuou, ainda solicitador-acadêmico, no Tribunal do Júri paulista. Foi professor de uns e outros que, adiante, se transformaram em grandes magistrados. Embora não se cuidando de um costume, tornou-se depositário da veste utilizada por alguns, enquanto, depois de concursados, deixavam a beca para vestir a toga. Teve a honra, este antigo rábula, de guardar para a posteridade um dos trajes de Waldir Trancoso Peres, dos maiores, se não o maior, tribuno da advocacia criminal brasileira. É muito relevante tal devaneio, porque o decanato é um posto reservado àqueles cuja memória é, obviamente, arquivo daquilo que nos aconteceu, desde o contável aos segredos ciosamente protegidos pelos participes. Dentro do contexto, enquanto recebendo o Ministro Lewandowski de volta à advocacia, é necessário dizer que o excelso magistrado é recebido com muito carinho pela família que o cedeu à judicatura. Diga-se, aqui, que galardão outro eu não tenho para abraçá-lo, a não ser aquele advindo da antiguidade. Não somos amigos. Nunca estivemos próximos.

 

Este avelhentado criminalista, quando levado a tanto, põe ao sol as vestimentas sagradas que servem solenemente ao exercício da profissão de advogado. Hoje é um daqueles dias. Colocou-as à luz de uma bela manhã neste jardim da velha residência a lhe servir de escrivaninha. A beca que foi de Troncoso Peres, o espanhol, pediu uma das rosas florindo no jardim ao lado. O Leite Fernandes foi lá, cortou os botõezinhos mais bonitos e os fixou no peitoral daquela vestimenta. Uma atitude suave sim, mas que tem para este rabulão um sentido todo especial: repita-se, o Ministro Lewandowski e o Paulo Sérgio nunca tiveram chegança, mas os votos daquele juiz foram lidos aqui, pois vinham robustos e nutridos pela sabedoria. Lendo o último Acórdão relatado por Ricardo Lewandowski, viu-se uma citação curta, discreta, mas significativa, entretanto, de um verdadeiro reencontro do juiz com a arte da advocacia: o Ministro se referiu ao Leite Fernandes enquanto este fora autor de obra atinente ao assunto posto em discussão. Este criminalista nunca foi dogmata de peso no panorama jurídico nacional. Escreveu aqui e ali, mas a citação no voto valeu no intimo deste advogado como um abraço de reencetamento da tarefa a que se dispõe o Lewandowski advogado, um bom dia, quem sabe …

 

Aquela menção foi como uma rosa, sim, posta entre as muitas páginas daquele voto volumoso. Daí, eu vim ao meu jardim. Escolhi uns botões no roseiral e os plantei na veste que pertenceu ao Waldir, companheira, como as outras, desta vilegiatura pelos atalhos da existência. Venha bem, Ministro-Advogado. Nós o reacolhemos, alegres e concorrentes na satisfação do retorno. E La Nave Va.

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