Home » Ponto Final » Aposentadoria do Ministro Eros Grau

Aposentadoria do Ministro Eros Grau

* Paulo Sérgio Leite Fernandes
Aposentadoria do Ministro Eros Grau

___________________________________________________________________________________

O Ministro Eros Grau, antecipando por alguns dias a aposentadoria compulsória, deixou o Supremo Tribunal Federal, voltando à atividade privada. Tem, aos setenta anos, muito espaço a trilhar, sabendo-se que o brasileiro conserva dose de vitalidade adequada a tanto. O cronista guarda na memória a imagem de um estimadíssimo parente que lá atrás, mal cumpridas sessenta e cinco primaveras, ia à padaria da esquina em pijama, arrastando chinelos no chão. O desconcerto entre o passado e o presente leva a resistir a tal forma antiga de desenlaçamento entre o Estado e aqueles que o servem, havendo movimento insistente no sentido de aproveitar mais um pouco a possibilidade de prestação de serviços de quem mantém, embora septuagenário, a plenitude da capacidade de contribuição. É lembrar Oscar Niemeyer e muitos outros, uns a trabalhar formas arquitetônicas privilegiadas, outros a produzir romances diferenciados, como Saramago, o da “Blimunda” e “Baltazar”, ou Jorge Amado, o de “Dona Flor e seus dois maridos”. E vai por aí. O Ministro Eros Grau deu entrevista ao “Estadão”, já com suas roupas civis e mantendo a barba cerrada que o diferenciou na Suprema Corte, além de temperamento forte e muita competência. Separe-se daquela comunicação um tema a impressionar bastante o cronista: a opinião contrária à divulgação pela TV dos debates havidos na Suprema Corte. Parece ter razão. A preocupação de um ou outro personagem com a aparência física pode levar o juiz a menor grau de afunilamento cerebral nas teses a serem expostas e, eventualmente, acirrar debate desnecessário. O homem é, sobretudo, um ser social e o exemplo de Kaspar Hauser (é ler o livro ou ver o filme) não se aplica à realidade. Vale a pena, a título incidental, a lembrança do próprio Chefe Maior da nação, cuja divulgação de imagem exige dispêndio nunca antes alcançado na história da República. Também ele vive em contato com o ciclópico alheio e se espelha na comunidade. O negligenciamento da aparição e a perda de oportunidades, como aquela de trazer para o Brasil a iraniana a ser apedrejada e morta pelos aiatolás amigos do Brasil, podem fazê-lo menor aos próprios olhos. O culto à personalidade (relembrem-se os gregos) vicia. Mesmo o Mahatma Gandhi não se livrou disso. Aliás, precisava do povo para buscar a pacificação da Índia. Dentro do paradoxo, o Ministro Eros Grau impressionou bastante o cronista com a posição contrária à divulgação ao vivo dos julgamentos na Suprema Corte. Diga-se, entretanto, que voltar atrás agora e retirar as sessões do Supremo Tribunal Federal da visualização pública constituiria, quem sabe, tarefa impossível, pois até o homem comum se acostumou a eleger heróis na Corte Maior, havendo preferência por um ou por outro, esperando-se a vitória do escolhido.

Há outras declarações importantes do Ministro. Resta ao comentarista, em síntese, desejar ao advogado Eros Grau um bom retorno a São Paulo e ao antigo “Itamaraty”. Ainda ecoam, ali, as vozes de muitos responsáveis direta ou indiretamente pelas tessituras políticas, judiciárias e culturais da pátria.

* Advogado criminalista em São Paulo há cinquenta e um anos

Deixe um comentário, se quiser.

E