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Problemas do processo penal virtual

* Paulo Sérgio Leite Fernandes
**Gustavo Bayer
Problemas do processo penal virtual***

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Desde que o homem aprendeu a escrever, juntando símbolos constitutivos das ligações entre várias letras e consubstanciando, então, o chamado alfabeto, os cidadãos se acostumaram à comunicação por meio de escritos. Postos em letras miúdas ou em compassos graúdos, os alfabetos, mesmo na universal e fictícia Torre de Babel, são inscritos inteligentemente em papiros, peles de animais, papelões, nos chamados elementos extravagantes e, enfim, em qualquer meio concreto passível de captação dos sinais representativos de transmissão do pensamento por via escrita.

O uso do papel para o fim da comunicação há de ser substituído brevemente pela visualização posta nas telas de computador. Isso permitirá, certamente, uma andadura mais rápida dos processos criminais, sabendo-se embora que a comunicação por via eletrônica surpreende, agora mais do que nunca, as pessoas que querem ou têm necessidade de grande velocidade na comunicação com terceiros.

Vale a pena dizer, nesse compasso, que o meio jurídico brasileiros está começando a assustar-se com a chamada “comunicação eletrônica”, sem fixação nos meios tradicionais e dependente, regra geral, somente da memória dos interlocutores. Vale isso para examinar-se a forma pela qual tal comunicação vem sendo realizada. Por exemplo: o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça já implantaram o peticionamento eletrônico entre cidadãos e os órgãos do Poder Judiciário, usando a internet, com supressão de documentos tradicionalmente gerados no papel. Isso produz uma noção clara de virtualidade, porque aquilo que é posto nas petições escritas se transforma em alguma coisa meio etérea e sujeita a degravações pelos intervenientes. Na maior parte das vezes essa mistificação dos procedimentos deixa de produzir um efeito saudável na captação das imagens postas em discussão. Não se faz, aqui no Brasil, como na América do Norte. Lá, as Cortes e os jurados ouvem aquilo que consta nas disputas e decidem, fazendo portanto imediatamente após os debates. Aqui não. Dir-se-ia que é mais fácil o debate sobre verdades postas pelas testemunhas e pelos envolvidos num sistema de gravação audiovisual, pois sempre se teria o tempo de constatação da verdade por meio da comparação entre aquilo que é dito por um e a afirmativa vinda de outro. Pode ser que assim seja, mas é importantíssimo que juízes, testemunhas, advogados e membros do Ministério Público estejam bem atentos na rememorização dos incidentes de percurso em que a maioria dos intervenientes, por uma tendência natural, aumentam, reduzem ou diminuem a possibilidade de rememorização daquilo que foi verificado alhures. Nos Estados Unidos existe, há muito tempo, um sistema de imediatidade processual que o brasileiro, quem sabe, pretendeu imitar em parte, sem o conseguir. Aqui, a solução dos processos deveria vir em sequência imediatas à colheita de provas e obtenção de testemunhos, mas acontece um autêntico simulacro, substituindo-se os debates orais por memoriais escritos. Dá-se uma consequência esquisita porque os partícipes não têm consciência de algo real, mas sim de uma fabulação. Tem sido difícil a adaptação.

* Advogado criminalista em São Paulo há cinquenta e um anos.

** Áudio e vídeo

*** O texto é de única e absoluta responsabilidade do autor Paulo Sérgio Leite Fernandes. O intérprete Gustavo Bayer é apenas o ator.

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