Dos lobos cerebrais de Neymar ao véu de Shahrkhani
* Paulo Sérgio Leite Fernandes
**Gustavo Bayer
Dos lobos cerebrais de Neymar ao véu de Shahrkhani***
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Não tudo no site é Direito Penal. No fim das contas, até bandidos, se houver no Brasil (uns elegantes, outros não), param de cometer crimes para assistir aos jogos do Brasil em Londres, pois, ninguém é de ferro. Dentro disso tudo, põem-se as armas de lado, deixa-se de matar gente por umas horas e se faz como na canção de Chico Buarque: “-Os pratos no chão, umas rodelas de linguiça calabresa comprada fiado no quitandeiro, algumas biritas de procedência duvidosa e é torcer pela vitória”, é cômico e trágico porque, no meio da guerra suja que a Polícia Militar de São Paulo trava com a marginalidade, sobra pouco tempo aos dois lados para verem Neymar, o menino prodígio, fazer seus shows de bola. Depois, mas depois mesmo, recolhem-se os cadáveres ao Instituto Médico-Legal.
Já se percebe que todo acontecimento tem no mínimo dois lados, sem exceção do cérebro da gente. Neymar, segundo penso, nasceu com funções inatas aperfeiçoadíssimas nos dois lobos cerebrais, quase idênticos, mas diferentes. Pelé, que conheci quando ele era bem moço, chuta muitíssimo bem com ambos os pés, mas um é melhor que o outro. Neymar também. O maravilhoso gol de falta feito em 29 de julho contra a Bielo-Rússia teve origem no pé direito do garoto, significando que o impulso inicial deve ter sido determinado pelo lobo oposto, porque é sempre assim: um acidente vascular cerebral predominando no lado esquerdo paralisa o direito. Perceba-se, portanto, que a técnica, nem sempre, é medida predominante no comportamento dos especialistas. A genialidade é fenômeno encontradiço em poucos. Conheci bandido, anos atrás, que atirava igualmente bem com as duas mãos, sem preferência, aliás. Federer joga tênis usando somente o braço direito e o faz maravilhosamente (assim como o Guga), separando-se dos outros tenistas que usam ambas mãos para o drive, notando-se que Nadal é canhoto, fator complicativo a mais.
Quando criança, impressionei-me com Leonardo da Vinci, que escrevia da direita para esquerda. Tento fazê-lo até hoje para enganar promotor público que mete o olho em minhas anotações, durante as audiências. Sai um negócio muito esquisito, mas consigo ler.
Ao lado disso tudo, acontece incidente sofisticado com a judoca Wodjan Ali Seraj Abdulrahim Shahrkhani, da Arábia Saudita. A fotografia da moça apareceu nos jornais. Ela é pesada (78 quilos ou mais), usa óculos e não se separa do “hijab”, ou véu. Lutar judô vestindo aquilo deve ser uma desgraça, porque além de atrapalhar, a adversária não tem nada com isso e pode usar o capuz num estrangulamento. Cuida-se da primeira vez em que a Arábia Saudita manda mulheres às Olimpíadas, não se podendo desprezar o progresso, embora, naquelas bandas, a suspeita de adultério possa ser apedrejada. Contou-me eminente cirurgião plástico ganhando a vida naqueles rincões que fica muito triste quando é pago para trabalhar em narizes das favoritas dos sultões: a beleza feminina, entre os “sheiks”, tem relação com narizes assemelhados aos das águias. Assim, às vezes, precisa reformar o apêndice nasal de duas ou três da mesma estirpe, quando acasaladas com o mesmo homem. Do ponto de vista estético é insatisfatório, embora recheando os bolsos do médico contratado.
Entenda-se bem que o escrito exibe certa dose de razoabilidade. Começa com a Polícia Militar e o PCC, passa por Chico Buarque de Holanda, exibe achego com Pelé e Neymar, repousa um pouco nos dois lobos cerebrais, liga-se no véu da judoca árabe e termina acarinhando as mulheres dos príncipes árabes (sempre as mulheres, sem elas a vida não tem graça). No fim de tudo, se Antonio Ferreira Pinto, Secretário de Segurança de São Paulo, consultar as estatísticas, verificará que o índice de criminalidade diminui nos dias em que o Brasil joga futebol, na Inglaterra. Até ele e o Comandante Geral da Polícia Militar do Estado param um pouco de enganar o povo quando Oscar, Neymar e Ganso estão a defender a bandeira brasileira. Haja futebol.
* Advogado criminalista em São Paulo há cinquenta e dois anos.
** Áudio e vídeo
*** O texto é de única e absoluta responsabilidade do autor Paulo Sérgio Leite Fernandes. O intérprete Gustavo Bayer é apenas o ator.