Home » Ponto Final » Júri de Mizael – Exposição pública de uma desgraça

Júri de Mizael – Exposição pública de uma desgraça

* Paulo Sérgio Leite Fernandes
**Gustavo Bayer
Júri de Mizael***

____________________________________________________________________________

Surge nos jornais no dia 6 de março a notícia de que o julgamento de Mizael Bispo de Souza, acusado de matar Mércia Nakashima, será transmitido pela televisão. A ideia provém do juiz Leandro Bitencourt Cano, presidente do tribunal do júri de Guarulhos. Segundo consta, a transmissão pela TV impediria que o povo se juntasse nas calçadas, à porta do tribunal, trazendo inclusive risco à tranquilidade dos intervenientes.

Todos gostaram da novidade. A inovação, seguramente, seria um dos aspectos da chamada transparência posta a viger no relacionamento entre o Estado e a comunidade.

No fim de tudo, psicologicamente, o televisionamento do embate entre acusação e defesa, visualizando-se o juiz, o réu e os debatedores como atores principais, atende a uma necessidade básica de projeção das criaturas no mundo exterior, acrescentando aos participantes a sensação maior de existirem. Isso não faz bem algum á justiça. Acicata os ânimos e força os partícipes a desempenho que esquece a destinação primordial do julgamento, ou seja, encontrar a verdade. O fato, como tal, perde importância e o teatro toma conta da representação. A chamada transparência vem produzindo efeitos ruins no próprio Supremo Tribunal Federal. Ali, os juízes passaram a ser criaturas comuns, cada qual com seus problemas pessoais e, inclusive, suas dores físicas. A toga do juiz, a batina do padre, a bata do médico e a farda do bombeiro existem por razões muito importantes: destinam-se a diferenciar os profissionais referidos. Na medida em que são despidos, assumem um grau de comunização que lhes tira a predominância imprescindível à excelência de suas funções. Transformam-se em deuses de barro, perdendo a credibilidade. Nessa particularidade, sob os faroletes das câmeras de televisão, um magistrado é capaz, inclusive, de agradecer o apoio e a presença da mulher entre os circunstantes na plateia do tribunal do júri. Fica parecido com o carrasco que na Idade Média, ou na França impiedosa, acenava para a família antes de desengatilhar sobre o pescoço do condenado a lâmina ferrugenta de Madame Guilhotina. Que coisa horrível!

* Advogado criminalista em São Paulo há mais de cinquenta e dois anos.

** Áudio e vídeo

*** O texto é de única e absoluta responsabilidade do autor Paulo Sérgio Leite Fernandes. O intérprete Gustavo Bayer é apenas o ator.

Deixe um comentário, se quiser.

E