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Câmara dos Deputados desafia o Supremo Tribunal Federal

* Paulo Sérgio Leite Fernandes
**Gustavo Bayer
Câmara dos Deputados desafia o Supremo Tribunal Federal***

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O Deputado Natan Donadon, condenado a 13 anos, 4 meses e 10 dias pelo Supremo Tribunal Federal, está preso. A decisão transitou em julgado. Paradoxalmente, o réu mantém mandato, embora segregado no presídio “Papuda”, epíteto que sempre lembra um feio e desagradável sapo. O Ministro Marco Aurélio, comentando o fato, fez o que não costuma fazer, embora irônico em relação a temas outros: feriu o réu indiretamente, afirmando que aquela penitenciária ficaria honrada com a presença do condenado. Evidentemente, a manutenção do statu quo do parlamentar não é definitiva, pois submetida aos incidentes de tramitação posterior. Entretanto, protegidos pelo voto secreto, muitos parlamentares deram à Corte Suprema um recado de inconformismo contra a impositividade da cassação.

Deixe-se de lado o mérito do conflito. Sempre entendemos que o Supremo Tribunal Federal é o maior poder da República, embora, constitucionalmente, haja equalização com os demais. Na prática, havendo conflito de posições, a Jurisdição vence sempre, a menos que se imponha o “estado de exceção”, fenômeno já acontecido mas posto hoje nas lonjuras. Impressiona, entretanto, um momento curioso no comparecimento do Deputado à Câmara para fazer a sua defesa: descumpriu-se, à entrada, Súmula Vinculante do próprio Supremo Tribunal Federal, enquanto regulamentando o uso de algemas, porque os jornais, escritos ou divulgados por via digital, exibem o homem algemado e, pior ainda, com os ferros lhe prendendo as mãos nas costas. Certa houve episódio que, se verdadeiro não for, é quase: lá atrás, na Amazônia, indianistas brasileiros se acercaram de algumas índias a tomarem banho nuas, num regato ou coisa parecida. As silvícolas, vendo-se descobertas, não protegeram a região pubiana mas sim esconderam os rostos, repetindo, sem o saberem, aqueles episódios versados nas tragédias gregas. Nestas, os atores usavam máscaras. Daquilo e de outros episódios advém a expressão “personalidade”, derivada de persona.

O ferreteamento pelas costas é o pior envilecimento acossando o ser humano. Até delinquente vagabundo, quando capturado pela polícia, esconde o rosto sob a camisa, se houver. Dentro de tal contexto, é uma vergonha o Deputado ter sido exibido sem poder esconder-se à visitação pública. É possível que tenham retirado as algemas durante o julgamento, mas entrou amarrado e saiu assim. Obviamente, enquanto com os braços presos, não honrou a “Papuda”, mas seria, se e quando os presos pudessem, escarnecido pelos novos companheiros. Tal episódio faz desconfiar da veracidade do comentário atribuído a Marco Aurélio, posto entre os mais respeitados pelo cronista no panorama judiciário brasileiro.

* Advogado criminalista em São Paulo há mais de cinquenta e quatro anos.

** Áudio e vídeo

*** O texto é de única e absoluta responsabilidade do autor Paulo Sérgio Leite Fernandes. O intérprete Gustavo Bayer é apenas o ator.

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